Padre Emílio não
sabia bater pênaltis, mas como o time em que jogava não tinha nenhum batedor
oficial, o treinador estipulou que quem sofresse a falta era quem faria a
cobrança sendo que na impossibilidade de ser o próprio, seria o Padre Emílio, o
mais velho da equipe, o responsável pela tarefa. Foi o que aconteceu no último
jogo do Cumarú Esporte Clube. O ponta de lança Wedesley foi derrubado na área e
teve que ser retirado de campo com suspeita de fratura no perônio. Lá foi o
Padre Emílio aplicar o castigo máximo ao adversário que ganhava de um a zero. Era
a chance do empate que tanto precisava o Cumarú para manter-se bem no
campeonato da várzea. Saiu calmamente da zaga onde se postava durante quase
toda a partida e, em passos decisivos atravessou o campo sempre de olho no
goleiro que parecia expressar um ligeiro sorriso. Padre Emílio foi logo
implicando com o adversário. “E isso aí na orelha brilhando mais que catarro na
parede com farol de automóvel batendo em cima, que que é isso?” O defensor
trocou o sorriso debochado pela cara de quem não entendeu patavina. E o Padre
continuou com a pressão psicológica. “No meu tempo quem usava brinco era
cigano. Uma argola, numa orelha. Nas duas era coisa de mulher. Tá imitando o
Cristiano Ronaldo ou o Maradona? Nunca vi goleiro usar brinco! É diamante ou
foi comprado no brechó?” O goleirinho já incomodado conseguiu reagir: “Seu
Padre tá tirando onda com minha cara!?” O árbitro interferiu: “Vamos logo com
isso ou dou cartão amarelo pros dois!” Padre Emílio insiste com a guerra de
nervos e diz: “Senhor juiz, se não me engano é proibido jogar com joias. é uma
questão de segurança!” O juiz olha para o goleiro e este, solenemente, retira
os brincos, coloca-os no fundo da rede e se posiciona altivamente como que a
dizer que com ou sem brinco era mais ele e não seria um padre perna-de-pau que
só sabia dar pancada que iria bater-lhe. Ele que era um bom goleiro e que até
tinha a fama de apanhador de pênaltis! O Padre Emílio que tinha por lema
“quando não se sabe fazer, faz-se” fez. Fechou os olhos e mandou uma bicuda. A
bola foi forte e rasteira, bem ao canto, como se tivesse sido atirada por um
especialista, mas o keeper, que apesar da pouca estatura tinha bom impulso e
elasticidade, alcançou a esfera e agarrou-a firmemente com as duas mãos. Foi um
momento de puro espetáculo. O goleiro acenou para a pequena, mas ruidosa
torcida e foi pegar os brincos ainda com a bola debaixo do braço. O juiz não
conversou. Apitou gol e o zagueiro Padre Emílio foi o carregado aos ombros até
à venda do Gonzaga onde esperava, geladinha, uma grade de cerveja. Comentou-se
que um caso parecido acontecera com o Ademir Queixada, excelente batedor de
pênaltis do Vasco da Gama. Mas foi nos antigamentes.
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