sexta-feira, 26 de abril de 2013

Mais uma do Padre Emílio


Padre Emílio gosta de galinha gorda. Daquelas da gordura amarela que da cá um pirão de lamber os beiços! Dona Ednéia todos os meses separa a galinha mais gorda do seu galinheiro e leva para o padre. Isso, até três meses atrás, quando começou a desaparecer justo a galinha da oferta. A princípio pensou-se que se tratava de uma mucura, mas nunca se viu gambá tão esperto e Dona Ednéia além da arapuca, ficou de atalaia e viu. “Eu vi, senhor padre!” O gatuno era o Gilsinho. Filho de boa família, frequentador da paróquia. Um bom rapaz! “Vício! Dona Ednéia, vício!” “Desconjuro, senhor padre, mas eu até pensei em chamar a polícia!” Bom menino! É estudioso, trabalhador e ponta direita do Flamenguinho. “Não faça isso, dona Ednéia! Deixe comigo!”
Padre Emílio não é violento e não gosta de confusão. Dá um boi para não entrar numa briga e dá uma boiada pra ser o primeiro a sair dela. É de paz. Mas tudo tem um limite. E essa tênue linha divisória de humores ele transpôs quando pediu ao treinador que o deixasse atuar na lateral esquerda no jogo da primeira mão com o Flamenguinho de Baixo. O treinador achou estranho o pedido, mas era apenas mais uma esquisitice do padre que não tem nem cacoete de lateral. Porém, permitiu a doidice, desde que fosse por pouco tempo. “Só o tempo de dar um recado.” No primeiro ataque pela direita o Gilsinho passou a bola por entre as pernas do lateral improvisado. Por sorte o cruzamento foi para fora. Na segunda, o padre chegou primeiro à bola, mas manteve o pé em riste acertando a canela do moleque. O juiz assinalou jogo perigoso. Padre Emílio correu para dentro da área e rechaçou com a cabeça o tiro livre indireto. Mas o recado ainda não estava completo. Numa bola dividida o padre acertou um tostão no Gilsinho que ficou rebolando no chão. Padre Emílio voltou para a sua posição e deu por encerrada a questão para não levar com o segundo cartão amarelo e ser expulso de campo. Mas quando terminou o jogo foi ter com o Gilsinho que ainda puxava da perna e reclamou. “Pô, seu padre! Só porque eu lhe dei uma caneta!” “Não! Foi por causa da galinha gorda que eu não como há três meses.” E a ameaça! “Ainda temos o returno!” Todos os meses, dona Ednéia leva para o padre a galinha mais gorda de seu galinheiro, do qual continua desaparecendo galinha. Mas só as magricelas! 

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Padre Emílio


Padre Emílio não sabia bater pênaltis, mas como o time em que jogava não tinha nenhum batedor oficial, o treinador estipulou que quem sofresse a falta era quem faria a cobrança sendo que na impossibilidade de ser o próprio, seria o Padre Emílio, o mais velho da equipe, o responsável pela tarefa. Foi o que aconteceu no último jogo do Cumarú Esporte Clube. O ponta de lança Wedesley foi derrubado na área e teve que ser retirado de campo com suspeita de fratura no perônio. Lá foi o Padre Emílio aplicar o castigo máximo ao adversário que ganhava de um a zero. Era a chance do empate que tanto precisava o Cumarú para manter-se bem no campeonato da várzea. Saiu calmamente da zaga onde se postava durante quase toda a partida e, em passos decisivos atravessou o campo sempre de olho no goleiro que parecia expressar um ligeiro sorriso. Padre Emílio foi logo implicando com o adversário. “E isso aí na orelha brilhando mais que catarro na parede com farol de automóvel batendo em cima, que que é isso?” O defensor trocou o sorriso debochado pela cara de quem não entendeu patavina. E o Padre continuou com a pressão psicológica. “No meu tempo quem usava brinco era cigano. Uma argola, numa orelha. Nas duas era coisa de mulher. Tá imitando o Cristiano Ronaldo ou o Maradona? Nunca vi goleiro usar brinco! É diamante ou foi comprado no brechó?” O goleirinho já incomodado conseguiu reagir: “Seu Padre tá tirando onda com minha cara!?” O árbitro interferiu: “Vamos logo com isso ou dou cartão amarelo pros dois!” Padre Emílio insiste com a guerra de nervos e diz: “Senhor juiz, se não me engano é proibido jogar com joias. é uma questão de segurança!” O juiz olha para o goleiro e este, solenemente, retira os brincos, coloca-os no fundo da rede e se posiciona altivamente como que a dizer que com ou sem brinco era mais ele e não seria um padre perna-de-pau que só sabia dar pancada que iria bater-lhe. Ele que era um bom goleiro e que até tinha a fama de apanhador de pênaltis! O Padre Emílio que tinha por lema “quando não se sabe fazer, faz-se” fez. Fechou os olhos e mandou uma bicuda. A bola foi forte e rasteira, bem ao canto, como se tivesse sido atirada por um especialista, mas o keeper, que apesar da pouca estatura tinha bom impulso e elasticidade, alcançou a esfera e agarrou-a firmemente com as duas mãos. Foi um momento de puro espetáculo. O goleiro acenou para a pequena, mas ruidosa torcida e foi pegar os brincos ainda com a bola debaixo do braço. O juiz não conversou. Apitou gol e o zagueiro Padre Emílio foi o carregado aos ombros até à venda do Gonzaga onde esperava, geladinha, uma grade de cerveja. Comentou-se que um caso parecido acontecera com o Ademir Queixada, excelente batedor de pênaltis do Vasco da Gama. Mas foi nos antigamentes.